quinta-feira, 12 de maio de 2016

Após audiência pública, DPU participa de nova portaria sobre doação de sangue

A Defensoria Pública da União (DPU), por meio do GT – Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI, vai integrar o grupo responsável pela discussão e elaboração de nova edição da portaria do Ministério da Saúde que trata de doação de sangue. A proposta de substituição da Portaria 2.712/2013, que proíbe a doação por homossexuais, é parte da resolução aprovada durante a audiência pública Igualdade na Veia: Doação de Sangue por Homossexuais, realizada segunda-feira (9), em São Paulo, pela DPU, com participação da sociedade civil organizada, parlamentares e dirigentes do ministério.

Outro resultado da audiência será a apresentação de uma proposta de decreto legislativo para sustar a eficácia da atual portaria, conforme compromisso assumido durante o ato pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF), nos termos da prerrogativa garantida ao Congresso pelo Artigo 49, V, da Constituição Federal. 


O objetivo da audiência pública Igualdade na Veia: Doação de Sangue por Homossexuais foi o de abrir um diálogo entre o Ministério da Saúde e a sociedade para discutir a proibição da doação de sangue por homens homossexuais e possíveis mudanças que venham a possibilitar inclusão, igualdade e cidadania na doação de sangue. A iniciativa foi do Grupo de Trabalho Identidade de Gênero e Cidadania LGBTI, instituído pela Defensoria Pública da União para propor e executar medidas de proteção judiciais e extrajudiciais para este grupo social.

O tema começou a ser discutido com o Ministério da Saúde a partir da recomendação expedida em janeiro desse ano pela Defensoria Pública do Estado da Bahia e a DPU, para retirada dos critérios discriminatórios promovidos em portaria que trata de doação de sangue, que classifica como inaptos para a doação homens que mantiveram relações com outros homens nos 12 meses anteriores à doação. Com isso, procura promover a inclusão, a igualdade e a cidadania para a comunidade LGBT.

A mesa da audiência pública contou com a participação do defensor público federal Erik Boson, coordenador do GT; Fabiano Romanholo, representando o Ministério da Saúde; Symmy Larrat, coordenadora-geral de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; e Toni Reis, militante do Grupo Igualdade Na Veia.


Debate

Os argumentos da maioria dos participantes que se pronunciaram favoráveis à liberação da doação de sangue por homossexuais giravam em torno da natureza discriminatória do critério estabelecido pela portaria, pois em muitos hemocentros o questionário feito aos potenciais doadores inclui a orientação sexual – e em caso de doador homossexual, ele é imediatamente declarado inapto para a doação, mesmo se pratica sexo seguro dentro de uma relação estável.
O defensor público federal Erik Boson classifica a medida como discriminatória e que ajuda a estigmatizar a população gay, atribuindo a estes o estigma de “grupo de risco”, não considerando razoável a existência da previsão, na medida em alimenta, reproduz e reforça a discriminação já existente na sociedade.

Fabiano Romanholo, representante do Ministério da Saúde, salientou que a portaria que regula a doação de sangue em todo o Brasil foi revisada e relançada esse ano, e que todos os critérios visam a segurança do receptor do sangue. Além disso, reforça que as medidas da Portaria não foram criadas com objetivo discriminatório, uma vez que classifica “comportamentos de risco” e não “grupos de risco”.

Para Symmy Larrat, da Secretaria de Direitos Humanos, “transformar a prática sexual [de homens que fazem sexo com homens] em comportamento de risco é discriminar a orientação sexual”. Ela ainda citou que a janela imunológica (termo utilizado para o tempo em que o vírus do HIV fica indetectável por exames após a infecção) ocorre em todas os indivíduos, independentemente de serem homossexuais ou não, então não é um elemento válido para invalidar a doação de sangue por HSH.

Toni Reis, também participante da mesa, pediu que a medida da Portaria que considera a prática de sexo casual e com desconhecidos seja aplicado como comportamento de risco para indivíduos tanto homossexuais quanto heterossexuais. Fernanda Vilares, representante do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, reforçou a ideia, considerando que o “risco de transmissão se deve à falta de proteção, não à orientação sexual”.

O médico Gerson Ferreira, do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, por sua vez, argumenta que o critério segue dados estatísticos colhidos pelo Ministério, e que foi constatado que a incidência de contágio pelo HIV pelo grupo HSH (ou seja, homens que mantém relações sexuais com homens) é maior do que a incidência na população em geral, embora refute a terminologia “grupo de risco”.



Diálogo favorável

A segunda parte da audiência, em forma de debate, contou com a presença da deputada federal Erika Kokay (PT-DF). Toda a discussão realizada durante a audiência tinha por objetivo chegar a um consenso entre Ministério da Saúde, o GT e os apoiadores do movimento para uma nova portaria. A presença do Ministério, inclusive, foi vista com positividade, pois mostra uma postura aberta ao diálogo com a população.

Investigar as causas da epidemia recente (e crescente) de HIV entre jovens gays, humanizar o atendimento aos doadores e revisar as práticas consideradas de risco pela Portaria de modo a não excluir potenciais doadores, independentemente de sua sexualidade, foram pontos de concordância entre as partes. A deputada federal Erika Kokay anunciou sua decisão de propor um decreto legislativo para suspender a portaria, e convidou a DPU para participar dessa discussão dentro do Congresso Nacional.

Ficaram ainda acordados diversos encaminhamentos junto ao próprio Ministério da Saúde, como a participação da DPU na elaboração de nova redação da Portaria. Todas as informações e propostas serão reunidas em um documento com as reinvindicações dos grupos para o melhor tratamento da causa do direito à doação de sangue pela população LGBTI e análise para próximas ações que sejam necessárias.

Participaram da audiência as seguintes entidades: Artgay SP, Associação da Parada do Orgulho LGBT (APOGLBT), Conselho Nacional de Combate à Discriminação de LGBT (CNCD/LGBT), Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS-SP, Coordenação de Políticas para LGBT (CGLGBT), Comissão Especial de Diversidade Sexual e Identidade de Gênero da ANADEP, Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), Núcleo especializado de Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito da Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE-SP), Grupo Dignidade, Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGE/SP), Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo, Faculdade de Direito da PUC/SP, Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo e Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.


Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União

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